Sábado, 23 de
Novembro de 2024
Direito & Justiça

Suspensão

STF suspende novo piso da enfermagem

A decisão dá prazo de 60 dias para entes públicos e privados da área da saúde esclarecerem o impacto financeiro

Foto: Divulgação
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Ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF)

05 setembro, 2022

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu  domingo (4/9) o novo piso salarial nacional da enfermagem. A decisão dá prazo de 60 dias para entes públicos e privados da área da saúde esclarecerem o impacto financeiro, os riscos para empregabilidade no setor e eventual redução na qualidade dos serviços. O objetivo é que o novo valor seja sustentável. última quarta-feira (31/8), a Federação Brasileira de Hospitais orientou seus filiados a não alterarem o valor pago aos enfermeiros. A decisão não analisa a legalidade da criação do novo piso da enfermagem. O ministro inclusive ressalta a importância de valorizar essa categoria profissional. No entanto, o objetivo é um freio de arrumação, com tempo pré-definido para encontrar uma solução de aterrissagem definitiva. "Vai acontecer agora o que deveria ter acontecido antes, dentro do Congresso Nacional. Voltamos ao tempo do bom senso. O que vai se discutir é qual é a forma de homenagear os enfermeiros que tenhamos solvabilidade, palavra usada pelo ministro, ou seja, possibilidade de que seja cumprida a decisão - diz Antônio Britto, diretor executivo da Associação Nacional dos Hospitais Privados (Anahp). A lei 14.434, sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em 4 de agosto, estipula que o piso salarial da categoria no país, que não era estabelecido em âmbito nacional, passa a ser de R$ 4.750 para os enfermeiros, além de 70% desse valor para técnicos e 50% para auxiliares e parteiras. Logo depois da sanção, no entanto, entidades ligadas a hospitais se queixaram de que não seria possível arcar com esse piso. A Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde) entrou com uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo contra a nova lei. O principal argumento é que a legislação não apontava fontes de custeio, já que o piso também teria de ser cumprido por União, estados e municípios. Estudo técnico da Câmara mostra que 1,3 milhão de profissionais empregados em estabelecimentos de saúde no país com obrigatoriedade de ganhar ao menos o piso. Segundo levantamento do Diesse, com dados de dezembro de 2020, 54% das vagas para enfermeiros no país pagam abaixo do novo salário-base da categoria. Esse percentual salta para 82% no caso dos técnicos e fica em 52% para trabalhadores em vagas de auxiliares de enfermagem. Para Breno Monteiro, presidente da CNSaúde, a decisão tomada pelo STF neste domingo é fundamental para que não sejam tomadas medidas que possam precarizar a assistência, como redução de leitos ou demissões, dando tempo ao setor para buscar alternativas para o pagamento do novo piso: Quando existe uma disputa, parece que um lado ganha e outro perde, mas não é assim. É importante haver tempo para discussões, na tentativa de valorizar o profissional de uma maneira responsável que se busque a fonte de financiamento, a gradação ou o escalonamento de um piso salarial. Em entrevista ao GLOBO, o diretor executivo da Anahp, disse que as entidades não são contrárias ao reconhecimento profissional dos enfermeiros, mas que a criação de uma despesa de R$ 16 bilhões ao ano sem um mecanismo compensatório levará inevitavelmente a demissões no setor e consequentes fechamentos de leitos Brasil afora. André Silveira, sócio do escritório Sergio Bermudes, que atuou na causa pela Confederação das Santas Casas, disse que a decisão de Barroso é um" marco na jurisprudência do STF". Segundo ele, mesmo reconhecendo a importância dos enfermeiros e técnicos para o país e a necessidade de valorização dessas carreiras, é preciso um estudo sobre o impacto financeiro-regulatório, para que se compreenda a extensão dos custos e os efeitos adversos que o piso acarretará, tanto para o setor privado, como estados e municípios. "A União não pode impor um piso de cima para baixo e quebrar os orçamentos dos hospitais públicos, privados e entidades não lucrativas. A prestação de saúde no país estava sob o risco de iminente colapso",  disse Silveira. O movimento municipalista comemorou a decisão. Em nota, o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, destacou que a medida é fundamental para corrigir a situação atual. Segundo ele, passados 31 dias desde a promulgação da medida que implementou o piso, o Congresso Nacional não resolveu, até o momento, qual será a fonte de custeio para o piso. Estimativas da CNM apontam que o piso deve gerar despesa de R$ 9,4 bilhões apenas aos cofres municipais. Os profissionais da enfermagem sob gestão municipal somavam 747.756 ocupações em 2021, segundo registros do DataSus", diz um trecho do comunicado da CNM. A entidade ressaltou que a medida já vem acarretando desligamentos de milhares de profissionais. Alertou que uma das consequências será a queda da cobertura de programas essenciais, como o Estratégia Saúde da Família. "Da mesma forma, ocorrerá redução do quantitativo de profissionais de enfermagem nas equipes hospitalares, ambulatoriais, laboratoriais, de vigilância em saúde e tantos outros serviços que compõem o SUS, com grande e imensurável impacto à população". Relatora da comissão especial que analisou a proposta de emenda à Constituição do Piso da Enfermagem, a deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC) disse ao GLOBO ter recebido com tristeza a notícia de suspensão do piso. Ela afirmou ter certeza que Barroso não vê inconstitucionalidade na matéria e informou que marcará uma audiência com o ministro do Supremo para tratar do assunto. " O texto veio do Senado, que não apontou fontes de financiamento",  afirmou a deputada, ressaltando ser a única parlamentar enfermeira na Câmara. Carmen Zanotto disse que há vários caminhos para se obter recursos e evitar demissões e piora na qualidade dos serviços. Um deles está em um projeto, apresentado por ela em dezembro do ano passado, que permite a desoneração da folha de pagamento de empresas do setor de saúde. " Os grandes hospitais têm a folha desonerada, assim como as indústrias de calçados, de confecções, entre outros. Por que não desonerar as empresas de saúde do setor do setor privado? Por que não destinar parte dos royalties do petróleo, dos fundos especiais e do lucro das estatais, além de tantas outras fontes, para a saúde? E as desonerações que foram feitas pelo governo?",  perguntou a parlamentar.