O Ministério Público Eleitoral (MPE) apura se policiais federais se recusaram a prender empresários bolsonaristas por crime eleitoral, em Goiânia. Em um documento, procuradores questionam as ações de PFs durante fiscalização da promoção da “picanha mito” a R$ 22 e do anúncio de uma caminhonete a R$ 222.222,22, por empresas da capital. Em nota, a Polícia Federal disse que recebeu a requisição do MPE para apuração dos fatos e que realiza diligências que instruirão os correspondentes inquéritos policiais. Com a investigação em curso, a PF disse que fica impossibilitada de fornecer informações ou detalhes dos casos. O pedido de apuração pelo MPE foi assinado na terça-feira (25/10) por três procuradores regionais eleitorais: Daniel César Azeredo Avelino, José Ricardo Teixeira Alves e Célio Vieira da Silva. O g1 ligou para o Frigorífico Goiás, que promoveu a campanha "Picanha mito", mas uma atendente, que não quis informar o nome, disse que eles "não vão se posicionar". A reportagem também tentou contato com as concessionárias de veículos Navesa e Ciaasa, que fizeram "promoções" de caminhonetes a R$ 222 mil, por mensagens enviadas por volta das 16h20 de quinta-feira (27/10), em uma rede social, e aguarda retorno desde a última atualização desta reportagem.
‘Picanha mito’
No documento, os procuradores relatam que, no dia 2 de outubro, dia do primeiro turno das eleições, o Frigorífico Goiás, localizado em Goiânia, anunciou uma promoção chamada de “picanha mito” a R$ 22 o quilo e gerou um grande tumulto na porta do local. A propaganda usava a imagem do presidente e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL). Uma mulher morreu após passar mal durante o tumulto. No dia, após terem conhecimento do fato, a Procuradoria Regional Eleitoral de Goiás entrou em contato com a Polícia Federal e foi informada de que alguns servidores foram enviados ao local para averiguar a situação. Algumas horas mais tarde, o MPE recebeu comunicado de que, após campana no local, os policiais federais não haviam detectado conduta criminosa nas circunstâncias do ocorrido e, por isso, não prenderam ninguém. No entanto, no mesmo dia, a Procuradoria Regional Eleitoral de Goiás reuniu informações que confirmaram que o fato ocorrido no frigorífico Goiás se tratava de flagrante delito, por ser crime eleitoral, com pena de seis meses a um ano de prisão. Segundo apurado pela procuradoria, os representantes do frigorífico reuniram um “elevado” grupo de eleitores de Bolsonaro, “mediante entrega de produto alimentício, amplamente aprovado e desejado pelo consumidor, com preço manifestamente abaixo do mercado”. Além disso, houve “ostensiva e constante divulgação desses candidatos no dia do pleito”, resultando em “verdadeira propaganda eleitoral - abusiva e ilegal”. “Usaram abrangentemente a internet para divulgarem o número 22 e o nome de Jair Bolsonaro, vinculando-os com a promoção da picanha em novas postagens, no dia das eleições, com o nome "Bolsonaro Mito", o número 22 e a própria imagem dele”, escreveram os procuradores. No documento, o MPE disse ainda que a legislação eleitoral refuta a postura comercial do Frigorífico Goiás e lembrou que, no dia da eleição, “só está admitida a manifestação individual e silenciosa do eleitor, vedada a aglomeração de pessoas com vestuário padronizado”. Após verificar que a situação ocorrida no frigorífico se tratava de flagrante delito, o MPE contatou novamente a PF, para que os policiais prendessem os responsáveis pela propaganda eleitoral. No entanto, um dos policiais, segundo os procuradores, tentou "dissuadir" os outros, assim como membros do MPE. “De forma emocional, ultrajante e insistente, levantou diversos argumentos estranhos à lei penal para não realizar a diligência, inclusive a prisão dos envolvidos em flagrante delito. [...] Ele não se conformou, tecendo críticas destrutivas da atuação ministerial”, escreveram os promotores.
Caminhonete a R$ 222 mil
Após o ocorrido no frigorófico, o MPE teve informação de outros casos semelhantes. Um deles, promovido pelas concessionárias de veículos Navesa e Ciaasa, que fizeram "promoções" de produtos em favor de Bolsonaro. O MPE pediu a instauração de um inquérito policial à PF para apurar possível crime descrito no Código Eleitoral. No último sábado, dia 22, o grupo Navesa e Ciaasa divulgaram em jornal de ampla circulação em Goiás, na via digital e física, um anúncio que trazia o título “Promoção 22 Navesa Ciaasa”. Conforme os promotores, o anúncio enfatizava o apoio eleitoral: “somente no dia 22 de outubro de 2022, 22 Ford/Ranger com oportunidade única”, seguido mais abaixo do valor “R$ 222.222,22”. Além disso, a promoção iria somente até às 2h22 da tarde daquele dia. Após tomar conhecimento, o MPE foi informado de que a equipe policial constatou que as promoções em alusão não estariam em vigência. No entanto, após pesquisar nas redes sociais das empresas, os procuradores encontraram as propagandas ainda publicadas. Com isso, o MPE determinou que os seus agentes fossem até a Navesa, para elucidar as dúvidas sobre a ocorrência do delito, quando foi surpreendido por fotos que mostram diversas caminhonetes Ford/Ranger com os valores de oferta e compra escritos: “R$ 222.222,22”. “De novo, não se teve notícia da realização da prisão em flagrante dos responsáveis”, escrevera, os procuradores. Após as situações, o Ministério Público Eleitoral representou pela instauração de uma apuração interna para averiguar uma eventual infringência das normas de disciplina interna dos policiais federais.
Íntegra da nota da Polícia Federal:
“As requisições para a apuração dos fatos noticiados foram recebidas, registradas e resultaram na realização de diligências que instruirão os correspondentes inquéritos policiais. Uma vez que a investigação esteja em curso, pela política da Coordenação Geral de Comunicação Social da PF, neste momento, ficamos impossibilitados de fornecer pormenores e ou detalhes sobres os referidos expedientes.”