Uma gigantesca operação internacional contra o crime organizado permitiu a detenção de mais de 800 pessoas, depois que foram descriptografadas as comunicações entre bandidos que utilizaram, sem saber, telefones distribuídos pelo FBI, anunciaram na terça-feira (8/6) agências policiais. "Estas informações levaram durante a semana passada a centenas de operações policiais em escala mundial, da Nova Zelândia e Austrália a Europa e Estados Unidos, com resultados impactantes", declarou o vice-diretor de operações da Europol, Jean-Philippe Lecouffe. "Mais de 800 detenções, mais de 700 lugares com operações de busca e mais de oito toneladas de cocaína confiscadas", completou em uma entrevista coletiva um dos comandantes da agência de cooperação policial europeia que tem sede em Haia. Os agentes também apreenderam 22 toneladas de maconha, duas de anfetamina, 250 armas de fogo, 55 carros de luxo e mais de 48 milhões de dólares em diversas moedas e criptomoedas, segundo a Europol. Durante três anos foram distribuídos milhares de telefones que deveriam passar desapercebidos entre membros da máfia, dos sindicatos do crime organizado asiático, dos cartéis de drogas, entre outros delinquentes. Mas esta operação internacional impulsionada pelo FBI (a Polícia Federal dos Estados Unidos), que recebeu o nome "Escudo de Troia", permitiu o acesso da polícia de 16 países a quase 27 milhões de mensagens que os criminosos trocaram por meio de aparelhos criptografados com o sistema ANOM. O diretor adjunto do FBI, Calvin Shivers, destacou que a operação permitiu salvar "mais de 100" vidas ameaçadas.
"Vazio no mercado"
O primeiro-ministro australiano, Scott Morrison, disse que a operação "leva a um golpe severo no crime organizado, não apenas neste país, mas haverá um impacto do crime não organizado em todo o mundo". Na Austrália, 200 pessoas foram acusadas, a Suécia prendeu 155 - cinco delas na Espanha. A Finlândia prendeu cerca de 100, a Alemanha 70, os Países Baixos 49, a Nova Zelândia 35 e a Noruega 7, no âmbito da operação. Os Estados Unidos acusaram 17 administradores ou distribuidores de dispositivos ANOM, todos estrangeiros, dos quais 8 foram presos. Suas autoridades não relataram nenhuma prisão no país. “A investigação continua”, garantiram. A operação internacional começou depois que o FBI conseguiu infiltrar sistemas similares denominados "Phantom Secure" e "Sky Global", com os quais acessaram as comunicações de milhares de pessoas, incluindo suspeitos de crimes. "O fechamento dessas duas plataformas criptografadas de comunicação criou um vazio importante no mercado de comunicações criptografadas", explicou a polícia da Nova Zelândia. Para preencher essa lacuna, "o FBI operou seu próprio sistema de dispositivos criptografados, chamado 'ANOM'." Isso permitiu que ele "revertesse as coisas" contra os criminosos, explicou Shivers. “Pudemos ver fotos de centenas de toneladas de cocaína escondidas em carregamentos de frutas”, acrescentou. De acordo com documentos judiciais dos Estados Unidos citados pelo portal Vice, o FBI trabalhou com pessoas que conheciam os ambientes par desenvolver e distribuir os aparelhos ANOM por meio da rede "Phantom Secure", com a entrega de 50 telefones, especialmente na Austrália.
A polícia no bolso
Os telefones celulares não tinham e-mail nem serviço de ligação ou GPS. Os aparelhos eram adquiridos apenas no mercado clandestino por 2.000 dólares. Além disso, era necessário um código enviado por outro usuário do ANOM. "Não os distribuímos, são as pessoas que nos procuraram em busca desses dispositivos", disse Shivers. "Os criminosos tinham que conhecer outro criminoso para conseguir um aparelho", afirmou a polícia australiana em um comunicado. Para distribuir os dispositivos, a polícia utilizou pessoas que tinham influência nos círculos criminais, incluindo um traficante foragido na Turquia. "Os aparelhos circulavam organicamente e se tornaram populares entre os criminosos, que confiavam na legitimidade do aplicativo porque figuras reconhecidas do crime organizado os defendiam", completou a polícia da Austrália. Os criminosos influentes "colocaram a Polícia Federal australiana no bolso" de centenas de supostos bandidos", celebrou o comandante da força de segurança, Reece Kershaw. “Os criminosos consideraram o sistema seguro e o promoveram entre si como a plataforma a ser usada (...) Nada poderia estar mais longe da verdade”, disse a polícia holandesa. No total, 11.800 dispositivos foram distribuídos em todos os continentes. Austrália, Espanha, Alemanha e Holanda foram os países que mais receberam aparelhos. A infiltração acabou em março de 2021, quando um blogueiro detalhou as falhas de segurança do ANOM, apresentado como um dispositivo vinculado à Austrália, Estados Unidos e aos outros membros da aliança FiveEyes. A publicação foi apagada.
Fontes: