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Moro atrai dissidentes do bolsonarismo e abre espaço na direita para 2022

"As duas candidaturas que lideram as pesquisas [Lula e Bolsonaro] não são recomendáveis do ponto de vista da agenda anticorrupção", afirma Livianu

Foto: Divulgação
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Menos de um mês após ter reingressado no cenário político, o ex-juiz Moro apoio em segmentos que foram cruciais para a vitória de Bolsonaro há quatro anos

05 dezembro, 2021

Em 2018, a candidatura de Jair Bolsonaro (então no PSL, hoje no PL) representou um ponto de encontro para conservadores, liberais, lava-jatistas, antipetistas e suas subdivisões. Em 2022, seu ex-ministro Sergio Moro (Podemos) busca construir algo parecido. Menos de um mês após ter reingressado no cenário político, o ex-juiz vem conquistando apoio em segmentos que foram cruciais para a vitória de Bolsonaro há quatro anos. Embora ainda não admita a candidatura, Moro tem demonstrado que quer ser uma espécie de guarda-chuva tanto para a direita decepcionada com o presidente quanto para centristas que veem nele um líder moderado -ao menos na comparação com Bolsonaro. Veja como está o apoio dele até o momento em alguns setores que foram importantes para Bolsonaro em 2018 e deverão novamente ter papel relevante no ano que vem.

Ativistas

Os movimentos que se uniram a partir de 2014 em torno da pauta anticorrupção e organizaram manifestações pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) racharam já no começo do governo Bolsonaro. Os que foram para a oposição em 2019 agora aderiram à pré-candidatura de Moro. É o caso do MBL (Movimento Brasil Livre) e do Vem Pra Rua. Ambos estiveram presentes no ato de filiação do ex-juiz ao Podemos, em Brasília, em 10 de novembro. Personalidades que têm o combate à corrupção como bandeira também mostram simpatia por Moro, como o professor da USP Modesto Carvalhosa. Para Roberto Livianu, presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, a candidatura de Moro "é um fato positivo do ponto de vista democrático". "As duas candidaturas que lideram as pesquisas [Lula e Bolsonaro] não são recomendáveis do ponto de vista da agenda anticorrupção", afirma Livianu. Segundo ele, Moro tem a simpatia de muitos que atuam na área, mas isso não significa que o ex-juiz estará livre de questionamentos. "Muita gente que se dedica a combater a corrupção tem preocupação com a forma como foi conduzido o processo contra Lula, e há também os senões por Moro ter participado do governo Bolsonaro", diz.

Influenciadores

A maioria dos influenciadores digitais de direita segue fiel a Bolsonaro, a começar pelo principal deles, o escritor Olavo de Carvalho. Olavo e seus seguidores frequentemente fazem críticas ao que veem como fraqueza do presidente no combate à esquerda, mas devem repetir o apoio a Bolsonaro em 2022. Estão nessa categoria nomes como Allan dos Santos, Bernardo Küster e Rodrigo Constantino, entre outros. Na semana passada, o comentarista Caio Coppola ensaiou se desgarrar do grupo ao dizer, em um programa na rádio Jovem Pan, que daria um crédito de confiança a Moro. Criticado duramente pela direita bolsonarista nos dias seguintes, teve de recuar. Entre os principais influenciadores direitistas, poucos aderiram a Moro. Um exemplo foi o ex-bolsonarista Nando Moura, que tem um canal no YouTube com 3,1 milhões de inscritos.

Evangélicos

Líderes evangélicos de peso como Silas Malafaia, Edir Macedo e a cúpula da Assembleia de Deus seguem defendendo ferrenhamente Bolsonaro, mas Moro pretende em breve fazer incursões pelo segmento. "Moro se posicionou com relação a várias agendas, como combate à corrupção, economia, sustentabilidade e área social, mas ainda muito pouco ou nada falou dos seus compromissos com a pauta conservadora", diz o deputado federal Roberto de Lucena (SP), que é do Podemos, mesmo partido de Moro, e também uma importante liderança da igreja evangélica Brasil Para Cristo. Segundo Lucena, é preciso esperar o ex-ministro se manifestar sobre temas como aborto, questões de gênero, drogas e casamento gay. Desde que Moro rompeu com Bolsonaro, apoiadores do presidente têm tentado caracterizar o ex-ministro como progressista em temas culturais. Para isso, mencionam declarações passadas em que Moro defendeu o uso medicinal da maconha e disse ser razoável a decisão da Suprema Corte americana que liberou o aborto nos anos 1970. Um líder relevante que declarou apoio ao ex-ministro é o presidente licenciado da Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos), Uziel Santana. Em uma rede social, ele postou foto ao lado de Moro no ato de filiação ao Podemos. "Que Deus o abençoe e sustente nesta dura missão", escreveu Santana.

Militares

O setor mais identificado com o bolsonarismo registra também algumas das dissidências mais visíveis pró-Moro. Entre elas estão os generais Carlos Alberto dos Santos Cruz, ex-ministro da Secretaria de Governo de Bolsonaro, Otávio Rego Barros, ex-porta-voz da Presidência, Maynard Rosa, ex-secretário de Assuntos Estratégicos, e Paulo Chagas, que disputou o Governo do Distrito Federal em 2018 com apoio do presidente. "Muita gente vota no Bolsonaro por medo da esquerda. Mas não acho que ele seja a única solução para impedir a volta do Lula, num país de 200 milhões de habitantes", afirma o general Chagas. Segundo ele, Moro representa um "caminho do meio", algo que Bolsonaro deveria ter perseguido desde que venceu a eleição. "Moro defende valores caros aos militares, como soberania e nacionalismo. Ele tem uma visão liberal-conservadora, mencionando a necessidade de olhar para a questão social", diz. Bolsonaro ainda desfruta de amplo apoio na caserna, contudo, e tem o respaldo da maioria dos integrantes de instituições como o Clube Militar, por exemplo.

Armamentistas

Os defensores de ampliar as possibilidades de porte e posse de armas para a população têm em geral resistência a uma candidatura de Moro. Quando era ministro da Justiça e Segurança Pública, ele jamais fez uma defesa explícita do armamento, e chegou a dizer que iniciativas de Bolsonaro nessa área não haviam passado por sua equipe. Ativistas pró-armas, como Benê Barbosa e Marcos Pollon, são críticos das posições "desarmamentistas" do ex-juiz. Tendem a defender a reeleição de Bolsonaro, mesmo considerando que as mudanças na legislação foram tímidas no atual governo. Por outro lado, alguns integrantes da "bancada da bala" no Congresso, que são menos suscetíveis a pressões de ativistas, veem possibilidade de conversar com Moro sobre o tema. Como disse um deputado, o ex-juiz não é frontalmente contra armas, como são partidos de esquerda, mas, sim, defende que seu uso obedeça a regras.

Ruralistas

Outra base tradicional do bolsonarismo, o campo ainda registra poucos líderes de peso apoiando a pré-candidatura de Moro. O presidente conta com sólido respaldo entre um dos principais segmentos do agronegócio, o dos produtores de grãos, sobretudo sojicultores. Pesam, na avaliação do setor, obras de infraestrutura como a conclusão da pavimentação da BR-163, a chamada "rodovia da soja", que corta Mato Grosso e Pará, a ampliação do porte de armas em propriedades rurais e a retórica contrária ao meio ambiente e aos trabalhadores sem-terra. "Antes era uma dicotomia: botava alguém do agro na agricultura e alguém antagônico no meio ambiente. O campo caminhava com um peso nas costas. Hoje não é mais assim", diz o deputado estadual Frederico D’Avila (PSL-SP), ligado ao agro e apoiador de Bolsonaro. Um dos raros representantes do agro que aderiram a Moro é Xico Graziano, que foi deputado federal pelo PSDB, apoiou Bolsonaro em 2018 e se diz decepcionado com ele. Segundo ele, a timidez do setor em embarcar na candidatura do ex-juiz é natural nesse momento, mas que haverá adesões com o tempo. "Está tudo muito aberto ainda. Não é hora de fazer campanha".

Liberais

Os defensores do Estado mínimo foram uma força importante da coalizão que levou à vitória de Bolsonaro em 2018. O apoio veio na esteira da nomeação de Paulo Guedes como guru econômico do então candidato. O desgaste de Guedes ao longo do mandato, simbolizado pela lentidão nas privatizações e pela decisão de furar o teto de gastos, acabou afastando parte expressiva dos liberais de Bolsonaro. O ex-juiz vem fazendo acenos a esse grupo. Defendeu publicamente o teto e angariou a simpatia de grupos como o MBL e o Livres. Também nomeou o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore como seu conselheiro econômico, uma medida que foi elogiada por economistas de centro-direita. Há 15 dias, Moro reuniu-se com o liberal Hélio Beltrão, presidente do Instituto Mises Brasil. "Moro está indo numa direção correta. Está disposto a ouvir liberais, setores mais pragmáticos e aqueles que não gostam da polarização extrema", diz Beltrão, que vem subindo o tom das críticas a Guedes. Segundo ele, Moro pode ser uma opção aos que decepcionaram com o atual ministro da Economia. "Se ele fizer um plano econômico liberal, será uma alternativa. Mas, se não fizer, os liberais na hora H vão preferir o Bolsonaro."

Setor  cultural

É uma das áreas mais ideologizadas do governo, que enxerga a existência de uma "guerra cultural" contra a esquerda. Embora a maior parte das lideranças de oposição a Bolsonaro seja alinhada à esquerda, têm surgido vozes pró-Moro entre os decepcionados com o atual presidente. Um deles é o ator Carlos Vereza, conhecido por novelas como "Sinhá Moça" e "O Rei do Gado". "A biografia de Moro é inatacável, impoluta", diz o ator, que se encontrou com o ex-juiz em novembro. Disse que pediu a ele o "resgate da cultura"."É preciso retomar o status de ministério, porque como secretaria ficou algo largado. Também pedi que resgatasse a credibilidade da Cinemateca", afirmou. Vereza diz que o rompimento com Bolsonaro, ainda em 2019, foi um passo natural. "Só não muda de opinião sobre esse governo quem é fanático ou recebe dinheiro da Secom [Secretaria de Comunicação]. Não estou em nenhum dos casos", afirmou. Outro a romper com o presidente e simpatizar com Moro na área cultural é Ricardo Rihan, que foi secretário do Audiovisual durante quatro meses em 2019. "O Moro não é o melhor nome só para a cultura, é o melhor para o Brasil. Ele certamente vai respeitar artistas, realizadores e todas as formas de expressão artística e cultural, que Bolsonaro considera como inimigos a abater", diz.