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Novembro de 2024
Brasil

Demissões

Coronavírus: comércio pode demitir 5 milhões de pessoas no Brasil

Representantes dos comerciantes estimam cerca de cinco milhões de demissões, relativas a empregos diretos e indiretos

Foto: Divulgação
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De portas fechadas e sem verba, comerciantes esperam ajuda do governo para pagar funcionários

30 março, 2020

Rio de Janeiro (RJ) -  Com o fechamento de shopping centers, lojas de rua, bares e restaurantes para evitar a disseminação do coronavírus, associações que representam comerciantes estimam cerca de cinco milhões de demissões, relativas a empregos diretos e indiretos, caso o governo não interfira e ofereça apoio ao setor. O presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Rio de Janeiro (Abrasel-RJ), Pedro Hermeto, explica o cálculo: "Apenas o setor de alimentação fora do lar gera seis milhões de empregos. Sem apoio, a estimativa é que metade seja dispensada em um universo de 60 dias; somados aos empregos gerados pelo comércio, chegamos a esse dado" - encerrou. Hermeto, que é dono do restaurante Aprazível, em Santa Tereza, afirma cogitar a demissão de alguns funcionários. Segundo ele, a postergação de pagamento de tributos e a flexibilização de leis trabalhistas não impedem a falência de muitos estabelecimentos, que já estavam debilitados por conta da crise econômica de anos anteriores. O ideal seria a concessão de dinheiro do governo a fundo perdido para o custeio da folha de pagamento, ou seja, um auxílio que não precisasse ser pago lá na frente, diz ele: "Fizemos um apelo aos associados da Abrasel para evitar demissões. Mas, com o 5º dia útil chegando, sabemos que 300 empregados já foram mandados embora" - encerrou. A venezuelana Nardelys Mendonça, de 26 anos, que trabalhava como cozinheira, é um deles. Ela completaria três meses de experiência em abril e já havia recebido feedback positivo para a contratação efetiva. Mas o cenário mudou: "Eles optaram por me dispensar. Mas disseram que depois que isso tudo acabar, eu tenho chances de voltar", lamentou.   O presidente da Associação Brasileira dos Lojistas Satélites (Ablos), Tito Bessa, destaca que muitos estabelecimentos não vão conseguir sobreviver à crise. Segundo ele, 85% das lojas de shoppings são pequenos e médios espaços que contam com o fluxo diário de caixa para manter seu funcionamento. No entanto, ele alerta que o enxugamento no quadro de colaboradores e até medidas menos drásticas, como a redução dos salários e das jornadas podem ser bastante prejudiciais à economia. Hoje, os consumidores só estão preocupados com comida e saúde. O consumo deve cair em 50%. Sem renda, como as pessoas vão continuar comprando? Isso pode trazer uma recuperação bem lenta: "Temos que encontrar um caminho para evitar as mortes, mas também para evitar o desemprego, adiantou.  Para o antropólogo Michel Alcoforado, a pandemia promove a reorganização de básico e supérfluo para os consumidores, o que pode mudar as relações comerciais daqui para frente. A ida àquele restaurante após um dia ruim e o horário agendado com o barbeiro gourmet viram supérfluos da noite para o dia. Com isso, o varejo vai ser impactado. O desespero vem disso. Se a quarentena durar meses, temos que refletir como isso vai impactar a forma como nos relacionamos com as marcas. Muito tem se discutido sobre as medidas econômicas e de saúde neste momento: " Alguns defendem manter o isolamento por um período maior e controlar o vírus, para somente depois liberar o funcionamento normal do comércio, enquanto outros acreditam que o melhor seria iniciar a reabertura gradual dos estabelecimentos para minimizar prejuízos à economia, mesmo que, com isso, a doença possa contaminar mais pessoas", polemizou.  Para o professor de economia do Ibmec-SP, André Diz, a discussão é irracional, já que o objetivo da economia é gerar o bem-estar dos cidadãos de um país: "Se o governo fizer uma boa estrutura de recuperação judicial, de aumento de liquidez para as pessoas jurídicas, conseguiremos retomar o crescimento das empresas. As vidas das pessoas, no entanto, não são recuperadas", alertou.  O professor ainda ressalta que 64% do Produto Interno Bruto Brasileiro (PIB) têm como origem o consumo nacional. Por isso, ele acredita que, se empresários tentarem proteger o fluxo de caixa por meio de demissões, poderiam comprometer ainda mais o crescimento do Brasil. Na última sexta-feira (27/3), o governo anunciou uma linha de crédito emergencial para pequenas e médias empresas, a fim de ajudá-las a pagar os salários de seus funcionários pelo período de dois meses. Na opinião do advogado trabalhista Luiz Calixto Sandes, sócio do escritório Kincaid Mendes Vianna Advogados, isso não é suficiente. Embora possa resolver quase a metade do desemprego, de acordo com números oficiais divulgados, não soluciona. Reduzir salários e jornadas, ao meu ver, seria a opção mais econômica, explica ele: "Economizaria pelo menos 25% da folha de pagamento. Dispensar nunca é a melhor medida, porque também onera a empresa", finalizou.   Hermeto também acha que a linha de crédito não é suficiente para manter empregos. Bessa concorda e diz que a projeção de demissão é a mesma após o anúncio da linha: " medida favorece empresas de até R$ 10 milhões de faturamento (um terço do segmento). Só que 95% dos fornecedores das grandes varejistas são pequenas empresas. A partir do momento que você não paga o seu fornecedor, ele não paga o funcionário dele e vira uma cadeia". O especialista em varejo Leonardo Coelho ainda alerta para a possibilidade de algumas empresas não conseguirem arcar com os encargos trabalhistas devidos em casos de demissão sem justa causa: "Aquelas que estavam sem reserva financeira nenhuma, com a queda brutal nas vendas, podem não conseguir cumprir os compromissos trabalhistas". Algumas grandes empresas têm anunciado que vão manter seus colaboradores apesar do fechamento do comércio. A Renner foi a primeira grande varejista brasileira a parar 100% de suas lojas físicas, incluindo as marcas Camicado, Youcom e Ashua e, com o objetivo de manter os empregos, fez reduções drásticas de uma série de despesas, bem como a reavaliação de investimentos. A Via Varejo também informou que não tem plano de demissão em decorrência da crise de coronavírus e que, inclusive, deve lançar uma plataforma inédita de vendas para apoiar seus vendedores. Assim, eles poderiam continuar trabalhando em casa, de forma segura. Já a C&A informou que ainda avalia internamente quais serão os próximos passos em relação aos funcionários de lojas: “se serão dadas férias coletivas ou possibilidade de abatimento do período afastado do banco de horas”, finaliza. O posicionamento de pequenos lojistas de shoppings, no entanto, tem sido diferente. Gabriella Menezes, de 22 anos, por exemplo, foi demitida no dia 16 de março, o primeiro dia útil após o decreto estadual de fechamento do comércio entrar em vigor. Ela trabalhava como gerente em uma loja de roupas infantis para pagar uma pós-graduação: " É desesperador ser demitida no meio da crise. Acho que vai ser bem difícil encontrar outra vaga agora". O economista André Diz acredita que haverá  crescimento do desemprego entre os trabalhadores de até 25 anos e as pessoas de baixa qualificação, pois esses, em sua maioria, trabalham no varejo: " O setor do comércio é o que mais emprega. É responsável por 19% do total de ocupados. Portanto,infelizmente,é o que mais vai sofrer". A alternativa para que pequenos e médios negócios não decretem falência pode realmente ser a demissão de funcionários, na visão do especialista em varejo Leonardo Coelho. Isso porque muitas empresas já tinham a saúde financeira prejudicada, não conseguindo ter acesso a empréstimos devido a uma pontuação (score) muito baixa no mercado de crédito. Muitos lojistas não vão conseguir tomar nenhuma medida operacional porque todas as alternativas foram esgotadas nos últimos cinco anos, explica Coelho: "Se o empresário olha o caixa e percebe que só consegue pagar todos os funcionários por mais um mês, prefere não arriscar e encerrar os contratos, já que não se sabe até quando isso vai durar". Em contrapartida, Coelho avalia que aqueles empreendedores que conseguirem migrar as suas vendas para as plataformas online poderão ganhar fôlego e atravessar o período mais crítico: "Temos visto na China que o percentual de penetração do varejo eletrônico subiu, mesmo após as medidas de restrição. Dessa forma, é possível dizer que quem está apostando no e-commerce certamente estará melhor. E quem sobreviver à crise vai ter boas possibilidades de comprar os negócios que fecharem, aumentando assim sua participação no mercado como um todo".

Fonte: EXTRA