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Racismo: um câncer incurável

George Floyd, asfixiado até a morte por um policial branco

Foto: Divulgação
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George Floyd

29 maio, 2020

p/ Silvana Marta

Mineápolis ( EUA) - Um vídeo que mostra a morte de um homem negro (27/05) viralizou nas redes e gerou revolta em diversos países, dada a violência do ato em tempos de pandemia. George Floyd foi algemado, deitado de bruços no chão, enquanto o policial branco Derek Chauvin pressionava o joelho contra seu pescoço. Preso por suspeita de suposta fraude, o vídeo mostra que Floyd chora, geme de dor e implora: “Tudo me dói. Água ou algo, por favor. Por favor, por favor, não consigo respirar, agente, não consigo respirar”. Segundo o relatório policial, Floyd estava dentro de um carro quando foi preso e parecia drogado. Quando lhe ordenaram que saísse, “resistiu fisicamente”. Entretanto, um vídeo de vigilância divulgado na quinta-feira mostra o primeiro contato entre os policiais e o falecido e põe em terra a versão oficial. Um agente o escolta algemado para fora do carro quando ele se senta na calçada sem revelar indícios de resistir à prisão. A última imagem é a do corpo dele preso debaixo do carro da polícia, e um policial com os joelhos sobre seu pescoço, sorrindo e asfixiando-o. O prefeito de Mineápolis declarou: “Não sou promotor, mas deixe-me ser claro: o policial que fez a prisão matou alguém”, pedindo à comunidade que mantivesse a paz para que a tragédia não gerasse mais tragédia. Também acrescentou que Floyd “estaria vivo hoje se fosse branco”.

História

A luta por direitos dos afro-americanos é muito mais intensa do que a dos afro-descendentes brasileiros, a ponto de acharmos que os navios negreiros (tumbeiros)  levaram mais negros para a América do Norte.  Na verdade, o Brasil recebeu infinitamente mais escravos negros vindos da África que os Estados Unidos: 1,56 milhão contra 47 mil. Aliás, vieram mais escravos negros para o Brasil do que em qualquer outro país do mundo.

A escravidão no Brasil foi implantada no início do século XVI

O Ceará antecipou-se na abolição de seus escravos através do presidente da província, Sátiro de Oliveira Dias, o Dragão do Mar em 1884, tornando-se o primeiro Estado a abolir a escravidão no país. Em Goiás, Antônio José Caiado e o Frei Gil Vilanova criaram a ‘Obra Apostólica do Araguaia’ em 1887, que foi um movimento que levou os donos de escravos a alforriá-los para ficarem alinhados ao pensamento ideológico dos chefes políticos da época. Quando os escravos foram oficialmente abolidos no Brasil, em 1888, já não havia mais escravos em Goiás.

Brasil x Estados Unidos

A população negra do Brasil representa 54% da população. Assim como no Brasil, os Estados Unidos vivem uma escalada de violência contra negros, o que indica que o racismo tem crescido nos últimos anos. Com a morte violenta de George Floyd, em Mineápolis, dia 25/05/2020, a onda de protestos organizados por movimentos que defendem os direitos dos afro-americanos como o ‘Black Lives Matter’ se espalhou para outras cidades como Memphis (Tennessee) e Los Angeles (Califórnia). A polícia brasileira é a que mais mata e a que mais morre no mundo, de acordo com a Anistia Internacional, sendo que o número de pessoas mortas pela polícia em nosso país cresceu 18% em 2019.  Já o número de policiais mortos caiu 18%. Em 2018, 15,6% dos assassinatos no país foram provocados por policiais militares. 75% das vítimas de letalidade policial no Brasil é de negros. 

Os que disseram adeus João Pedro, adolescente negro de 14 anos morreu no último dia 18/05, ao ser baleado em operação policial, em São Gonçalo, município do Rio de Janeiro. A casa onde o menino estava foi alvo de mais de 70 disparos. Outro jovem de 18 anos, João Vítor da Rocha, foi baleado e morreu durante uma ação das polícias Militar e Civil na Cidade de Deus, na zona oeste do Rio de Janeiro, no fim da tarde de quarta-feira, dia 20/05

Omissão do negro brasileiro

Apesar disso, nenhum registro de reação ou protesto por parte das comunidades atingidas. Aliás, o negro brasileiro, de um modo geral, é negacionista e permanece em silêncio em relação ao violento racismo sob o qual o Brasil está imerso. Não vemos nenhuma celebridade negra da música ou do futebol brasileiro se posicionar sobre o assunto.  A marca ‘Pelé’ esteve entre as mais conhecidas no mundo ao lado de Coca Cola e Ferrari. Entretanto, Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, nunca se posicionou publicamente contra o racismo. Em 2015, esteve em Nova York sob a luz dos holofotes mundiais para encontrar com seu ex-parceiro de time (New York Cosmos), o alemão Franz Beckenbauer, no topo do Empire State Building, ao passo que deixou sua filha negra, a vereadora da Baixada Santista Sandra Arantes do Nascimento, 42 anos, morrer em conseqüência de um câncer de mama, sem ter ido ao seu enterro. Sandra ficou nacionalmente conhecida após travar uma longa batalha judicial pelo reconhecimento de sua paternidade que demorou quase trinta anos para acontecer. Ademais, Pelé ficou conhecido por seus relacionamentos com mulheres loiras e brancas, como Assíria Seixas e Xuxa Meneguel. Atualmente está casado com  Márcia Aoki, de ascendência japonesa.  Faz-se, portanto, uma justa e necessária correção do adágio popular retirado das estrofes do hino nacional: O gigante negro permanece adormecido.

* Silvana Marta  de Paula Silva, advogada, jornalista e escritora

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