Lucas Borges Teixeira Do UOL - São Paulo (SP)
São Paulo (SP) - Carolina Iara, Dafne Sena, Natália Chaves, Paula Nunes e Silvia Ferraro se conheceram entre a militância nos movimentos sociais e as plenárias do PSOL e começaram a reconhecer diversos ideais em comum. No começo deste ano, decidiram formar uma chapa coletiva para concorrer à Câmara Municipal de São Paulo. A principal proposta: trazer a participação dos movimentos sociais para dentro do Legislativo paulistano. Com frente em prol do feminismo popular, a mandata, como chamam, foi a sétima chapa mais votada da cidade, com 46.267 votos. O desafio, agora, dizem elas, é enfrentar o "conservadorismo e a extrema-direita" na Câmara paulistana.
Feminismo para a maioria
O ponto - e a vantagem, argumentam- de um mandato coletivo é juntar as diferentes experiências e propostas. A Bancada tem várias frentes: antirracismo, defesa dos direitos humanos, ecossocialismo, educação libertadora, novo modelo de segurança pública e antilgbtqifobia. Tudo isso permeado pelo feminismo popular, ou o "feminismo para as 99%". "É o feminismo que abraça as mulheres trabalhadoras em sua diversidade, negras periféricas, LGBTQI+, de profissões diversas, com representatividade. Todas nós compartilhamos desse ideal: feminismo popular, para a maioria", conta Silvia Ferraro, 51.Silvia, professora da rede municipal, representará a bancada no Plenário, visto que mandatos coletivos ainda não são reconhecidos no Brasil, e é a única a já ter concorrido a eleições —em 2012 à prefeitura pelo PSTU e em 2018 ao Senado pelo PSOL. "A ideia é trazer diversas representações do que é o feminismo, entendendo que o feminismo não pode se expressar por uma única pessoa", concorda Paula Nunes, 27. "[Ao cursar Direito na PUC-SP,] entendi a responsabilidade de ser uma mulher negra em uma universidade que não tinha pessoas como eu." Paula e Dafne Sena, 29, são advogadas criminalistas que lutam pela defesa dos direitos humanos, por um novo modelo de segurança pública antirracista e pelo ecossocialismo.
Contra o conservadorismo
Nesta eleição, o PSOL conseguiu seis cadeiras na Câmara paulistana (duas delas coletivas), maior bancada da história do partido na Casa —o triplo em relação à legislatura atual. Ainda assim, o maior desafio, de acordo com elas, é enfrentar o "conservadorismo e a extrema-direita". "A verdade é que a Câmara ainda é semelhante a o que era na legislatura anterior. São as mesmas ideias, mesmas pessoas, mesma concepção. Sabemos que existem representantes de minorias políticas que lutam até o fim pela retirada de direitos históricos dos movimentos", afirma Paula. "A onda conservadora continua sendo forte, sendo um perigo, um risco", concorda Natália Chaves, 25, tradutora e ativista do ecossocialismo. Elas lembram que, das 55 cadeiras da Câmara, só 13 são de mulheres -e, delas, a minoria é de esquerda.
Junto aos movimentos sociais
A ideia de um mandato coletivo —ou seja, com mais de um vereador na mesma cadeira, os covereadores— é relativamente nova. O primeiro eleito no país foi em 2016, na Câmara Municipal de Alto Paraíso (GO), pelo PV. Neste ano, além delas, o Quilombo Periférico (PSOL), com seis integrantes, também foi eleito em São Paulo. A ideia da Bancada Feminista, no entanto, é ir além: não fazer um mandato "apenas" com as cinco, mas junto aos movimentos sociais. Assim foram feitas suas principais propostas, como desapropriação de imóveis ociosos no Centro, regulação e controle do mercado de aluguel e proibição da presença cotidiana da Polícia Militar em escolas públicas."Todas as nossas propostas foram construídas com os movimentos sociais. Na pré-campanha, organizamos várias temáticas virtuais com presença [total] de mais de mil pessoas. Convidamos especialistas da academia, movimentos, e discutimos temas diversos que servem para nortear nosso mandato", conta Paula. "Nossa pegada é mais de pensar políticas para a cidade em conexão com os movimentos sociais, com esse horizonte do feminismo popular e também em conexão com os territórios", afirma Carolina Iara, 27, mulher trans e pesquisadora de ciências sociais. Essas reuniões se seguirão durante esse último mês antes da posse e ajudará a determinar os primeiros passos da bancada na Casa. Como exemplo, elas já têm encontros marcados com movimentos para elaborar um projeto de lei voltado à população trans de rua. "Temos uma grande dificuldade para elas conseguirem abrigos, porque abrigos para mulheres não aceitam mulheres trans e abrigos para famílias não aceitam mulheres trans casadas. Vamos discutir quais nuances o movimento social enxerga, porque nós, sozinhas, só sabemos algumas coisas", explica Carolina.
O respiro da esquerda em 2020
É nesta união com o movimento social que elas veem a força para o respiro da esquerda nestas eleições —em especial por meio do PSOL—, depois de dois grandes reveses em 2016 e 2018, e para o futuro eleitoral. "É uma onda que vem crescendo, mostra que a esquerda nunca parou", afirma Natália. "A gente continua na luta, como militantes dos movimentos sociais. Para a institucionalidade, [isso] pode estar mais afastado, mas nós sempre estivemos na luta." Elas dizem ver essa sinalização à esquerda também como uma mensagem de rejeição ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido). "Nós tínhamos um panfleto 'Fora Bolsonaro' que saía muito. As pessoas quiseram expressar nas urnas uma rejeição ao bolsonarismo", afirma Silvia. "Nós sentimos nas ruas que o espaço da esquerda se ampliou. Tanto na bancada do PSOL, que triplicou, como na chegada do candidato Guilherme Boulos no segundo turno." "A pandemia e a ação desastrosa do governo federal também ajudaram no retorno dos setores progressistas à institucionalidade, por uma experiência de certos setores da sociedade que não se contentaram com o último ano", concorda Carolina.
Fontes:UOL / www.poptvnews.com.br