Goiânia (GO) - O ex-presidente do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO), desembargador Gilberto Marques Filho, o também desembargador Orloff Neves Rocha e o juiz Ronnie Paes Sandre estão entre os investigados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em um suposto esquema de venda de decisões judiciais para favorecer empresas em processo de recuperação judicial. Advogados e empresários suspeitos de participarem do esquema também foram alvos de mandados de busca e apreensão pela Polícia Federal, na terça-feira (30/6). O desembargador Orloff Neves Rocha é suspeito de pedir R$ 800 mil ao advogado Ricardo Miranda Bonifácio e Souza para favorecer a usina goiana Centroalcool S/A em duas sentenças: uma para dar o comando da empresa de volta ao proprietário Alceu Pereira Lima Neto, afastado durante a recuperação judicial, e outra para colocar em suspeição a juíza Adriana Caldas dos Santos, que conduzia o processo na Comarca de Inhumas. Todos os citados no inquérito, que tramita sob sigilo na Justiça federal, são investigados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por corrupção, tráfico de influência, exploração de prestígio, advocacia administrativa e lavagem de dinheiro. O advogado Ricardo Bonifácio comunicou em nota que "não teve acesso ao inquérito, mas, em relação aos fatos apontados na decisão, já havia contribuído para a elucidação deles como testemunha na corregedoria do TJ-GO". A juíza Adriana Caldas dos Santos, de Inhumas, preferiu não comentar as investigações da PGR nem o cumprimento dos mandados pela Polícia Federal. O desembargador Orloff Neves Rocha e o juiz Ronnie Paes Sandre não foram localizados pela TV Anhanguera para se manifestarem. O ex-presidente do Judiciário goiano, desembargador Gilberto Marques Filho, disse, também em nota, que "nesses quarenta e quatro anos de magistratura nunca tive nenhuma nódoa na minha carreira, tendo, nessas mais de quatro décadas, pautado a minha atuação pela mais absoluta idoneidade e seriedade, tal qual é na minha vida pessoal". A Usina Centroalcool S/A afirmou na nota que os fatos em "que implicam na sua participação, foram levados pela própria empresa, em setembro de 2016, ao conhecimento da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Goiás, do Ministério Público Estadual e do Conselho Nacional de Justiça, tudo isso em total lisura e transparência". O Tribunal de Justiça de Goiás informou "que colaborou efetivamente com a ação da Polícia Federal, fornecendo todos os dados solicitados e prestando os esclarecimentos necessários à elucidação da questão".
Empresário diz que pagou por sentença
Segundo a investigação da Procuradoria-Geral da República, o dono da usina Centroalcool, Alceu Lima Neto, denunciou o suposto esquema ao Judiciário de Goiás após pagar R$ 800 mil para obter duas decisões favoráveis à sua empresa durante o processo de recuperação judicial. O jornal O Popular teve acesso a um trecho da investigação que mostra um diálogo entre Alceu Neto e o advogado da usina, Ricardo Bonifácio, em 14 de setembro de 2015, quando negociaram a compra das decisões com o desembargador Orloff Neves Rocha. Alceu Neto disse em depoimento à Justiça que entregou o valor ao advogado para ser repassado ao desembargador. O montante teria pago uma decisão para colocar o empresário de volta no comando da usina, após ser afastado durante a recuperação, sob o custo de R$ 600 mil, e a segunda decisão e R$ 200 mil para o desembargador acolher o pedido de suspeição contra a juíza de Inhumas, onde tramitava o processo, Adriana Caldas dos Santos.
- Eu tenho a solução para você voltar para a administração. Para isso, eu preciso de R$ 800 mil - teria dito o advogado ao dono da usina.
- R$ 800 mil para quê Ricardo? - pergunta Alceu Neto.
- O desembargador é o Orloff. Tá tudo certo. Você volta para o cargo imediatamente. É na hora. Pôs o dinheiro, ele dá - responde o advogado.
Segundo empresário, o desembargador concedeu as decisões após o pagamento. O pedido do dinheiro, segundo Alceu, partiu do próprio desembargador. No depoimento, ele diz que sacou o dinheiro da conta da usina.
Mandados de busca e apreensão
A Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ) determinou a apuração da denúncia e na terça-feira (30/6) a Polícia Federal cumpriu 17 mandados de busca e apreensão contra advogados, juízes, desembargadores e empresários. Os mandados foram autorizados pelo ministro Mauro Campbell Marques, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, pediu que as informações e eventuais provas colhidas sejam compartilhadas com a Corregedoria. A troca de dados servirá para que sejam adotadas as devidas providências pela Corregedoria com relação à possível prática de infração disciplinar por parte dos magistrados investigados. De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), a ação é um desdobramento da Operação Máfia das Falências, deflagrada em novembro do ano passado, em Goiás e mais três estados. Ela apurou a existência de um grupo suspeito de fraudar falências de empresas. Como membros do Judiciário com prerrogativa de foro foram investigados, a apuração passou a ser conduzida pela Procuradoria-Geral da República (PGR). O MPF informou que os magistrados são investigados "por integrar organização criminosa envolvida com a venda de decisões judiciais em processos de recuperação judicial de empresas".
Notas na íntegra
Ricardo Bonifácio Miranda
“Não tive acesso ao inquérito, mas, em relação aos fatos apontados na decisão, já havia contribuído para a elucidação deles como testemunha na corregedoria do TJGO. Lamento o fato de terceiro ter atribuído uma conduta incompatível com a moralidade de minha atuação enquanto advogado. Estou a disposição para esclarecer qualquer situação a mim atribuída e mostrar de forma veemente que jamais agi da forma apontada, estabelecendo a verdade dos fatos.”
Desembargador Gilberto Marques Filho
Nesses quarenta e quatro anos de magistratura nunca tive nenhuma nódoa na minha carreira, tendo, nessas mais de quatro décadas, pautado a minha atuação pela mais absoluta idoneidade e seriedade, tal qual é na minha vida pessoal. A respeito dos fatos veiculados na imprensa, dos quais ainda estou tomando conhecimento, informo que estou absolutamente tranquilo no sentido de que serão devidamente esclarecidos, para o que já estou colaborando com as autoridades competentes.
Centroalcool S/A
A empresa leva ao conhecimento do público em geral, que os fatos noticiados pela imprensa local e nacional na data de hoje, relativa a acontecimentos no âmbito do Poder Judiciário, e que implicam na sua participação, foram levados pela própria empresa, em setembro de 2016, ao conhecimento da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Goiás, do Ministério Público Estadual e do Conselho Nacional de Justiça, tudo isso em total lisura e transparência, carreando todos os fatos e provas que mereciam ser apreciados pelas autoridades competentes. Que confia na justiça e deixa de comentar os fatos e documentos carreados naqueles procedimentos instaurados pela própria empresa, uma vez que tais procedimentos se encontram sob sigilo judicial.
Tribunal de Justiça de Goiás
Sobre a operação deflagrada na manhã da terça-feira (30), por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o Poder Judiciário goiano informa que colaborou efetivamente com a ação da Polícia Federal, fornecendo todos os dados solicitados e prestando os esclarecimentos necessários à elucidação da questão. Como o processo corre em sigilo, o TJ-GO não pode fornecer mais detalhes, mas ressalta que se trata ainda de investigação e serão observados os princípios constitucionais, como o contraditório e amplitude de defesa, ou seja, dando aos envolvidos o direito de ampla defesa, de acordo com artigo 5°, inciso LV da Constituição Federal. Por fim, informa que o deslinde do caso é de seu total interesse e que continua à disposição, tanto do STJ quanto do Conselho Nacional de Justiça, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal para aclarar tudo o que estiver a seu alcance.
Fontes: G1 GO / www.poptvnews.com.br